E quanta coisa o espelho não consegue me mostrar, quão superficial é essa imagem que acredito ser eu. Em divagações me imagino um grãozinho de areia dentro de meu próprio corpo, arrastado pela corrente sangüínea, preso entre células que sequer imagino de onde vieram, sozinho, perdido em um mundo completamente desconhecido. E apesar disso tudo, estranhamente me sinto bem, como se mesmo sem saber onde estou, sei que estou protegido, sei que nada que há ali dentro me fará mal, e por isso relaxo e durmo.
Aquilo que chamo de ‘eu’, nada passa de um aglomerado de células semelhantes agrupadas e constituindo essa matéria que vejo refletida no espelho.
Meus cabelos, leves e tão independentes, parecem não fazer parte de mim, enquanto durmo, eles viajam, mergulham nesse mundo que me protege e mostram um pouquinho dele. Não preciso olhar, só me basta sentir. Tenho medo de abrir os olhos e me afogar, e me afogando acordar em um mundo menos estranho, porém muito mais perigoso, aquele comum a todos.
Comum a todos? Pode ser. Mas igualmente familiar... isso nem tanto.